Decadência

Desculpe-me Zuenir Ventura. Estava lendo seu livro e pensando.
Como é fácil para alguém como você que tem o reconhecimento que tem,
Esplainar sobre os seus luxos, seus tratamentos e dilemas clínicos.
Não sei se seu livro sairia se você fosse um paciente do SUS,
Um sistema em decadência que acredita-se ser o melhor do mundo.
Parabéns! Você é um ótimo escritor. Me despertou inveja.
E este mal secreto não é nada mais secreto.
E estou na minha própria ruína literária,
Se isso pode ser considerado como alguma coisa que tenha valor.
Não sei se devo lhe chamar como senhor,
(É um venerado membro da nossa academia brasileira de letras),
Mas por ler o que você escreve acho que somos um pouco conhecidos,
Nossas ficções se conhecem e se conectam neste exato momento.
Bom. Aceito bem determinadas coisas. E por um instante quis ser você.
Poder escrever, viajar e ter um tratamento médico adequado.
Não depender de uma vaga remanescente ou de um soro para evitar dor,
Isso dentro da perspectiva de um filho de um pai da classe média baixa,
Sem carteira assinada, viúvo e detentor financeiro da casa.
Um grande homem que cursou o supletivo depois de velho,
Para acabar os seus estudos do ensino médio,
E dar um bom exemplo, a este que escreve, para fazer faculdade,
Cursar como aluno especial de mestrado sua paixão,
E escrever estas porcarias que não tem mais o mesmo valor que antes,
Naquele belo período dos “Anos Dourados”, que valem boas lembranças.
“O que dói não é a morte, mas o padecimento” – página 87 de seu livro.
É isso que me dói. É isso que me dói e não a morte.
Abrir mão das coisas que eu conquistei para viver.
Por que nada mais é como era antes. Mesmo com minhas crises.
E agora eu sou um ser humano decadente, tentando ajuntar os pedaços,
Ou algumas coisas boas que acho que já povoaram a minha vida,
Lembranças, pessoas e lugares. Comidas que comia e não como mais.
Estou tentando sobreviver a mim mesmo, não á uma doença,
E isso está complicado. Eu sou pior do que um câncer.
Eu vou desistir da minha vida. Eu cobiço a alegria alheia.
Não imaginava que isso acabaria nesta depressiva decadência,
Eu trancado em um quarto abafado, com dores e fome.
E não imaginava que seria assim que as coisas fossem acabar.
Desta forma que nem nas minhas melhores ideias eu tinha imaginado.
Ontem eu recebi uma mensagem que dizia: “te admiro muito”.
Mas eu não admiro mais nada em mim. Não sou mais nada.
Não sou mais garoto, não sou mais amigo, não sou mais exemplar,
Não sou egocêntrico, não sou amado e nem sou mais misterioso.
Voltei a ir à Igreja, mas descordo das mesmas coisas, isso não nego.
Voltei mais uma vez a ir ao hospital, tomar soro, remédio na veia.
E remédios são o que não me faltam. O que me faltam são recursos.
Este era para o ser “o ano”. Apenas está sendo “a decadência!”.
E queria poder parar de ler o seu livro na metade,
Por que tenho inveja de alguém que é tão criativo na dor,
Assim como fiz com Clarice e a sua Maça no Escuro.
Quem sabe Ciranda de Pedra seja melhor que seu livro,
E não me faça desejar não ter vivido na última cirurgia que fiz.
Eu tenho inveja sim. Mas de alguém como você.
Do resto tenho dó, às vezes pena. E estou na minha ruína literária.

By: Vinicius de Góis
Feito em 08 de Abril de 2016.

Comentários

Postagens mais visitadas