Saudosismo (C-P.arta de Despedida)

Toda árvore que não dá bom fruto
Corta-se e lança-se ao fogo,
Passe-me o bisturi, monitore o batimento,
Saudosismo poético neste exato momento,
- “Precisamos fazer uma manobra de reanimação!”
- “Estamos perdendo o paciente..”....

Toda árvore também morre só.
Começar pelo final e terminar em um começo,
Sem pé e nem cabeça, divido em um terço,
Já reparou como tudo acaba,
Mas como tudo nunca é exatamente do mesmo jeito?
Todo dia acaba diferente um do outro,
Ao menos é assim para quem retira
Alguns minutos de tempo para refletir sobre isso.
Cada segundo de tempo passa a ser assim muito precioso.
Você consegue perceber,
Com o que e com quem está ocupando o seu tempo?
Cada despedida despercebida
Que você deixa alguma coisa que não é mais você para trás.
Já reparou que a grande parte
Das inquietações e arrependimentos
Advém do fato que nós não conseguimos
Ficar solitários com os nossos pensamentos?
A constante busca,
A constante fala,
A mobilização de energias,
Não é apenas para pura curiosidade
De nos descobrimos nos outros,
E nem para saber o que os outros precisam ou pensam.
A gente busca o que não teve ou o que não pode ter.
Mas não é sobre busca.
É defesa.
Usarei de um argumento de Fernando Pessoa,
Quando no auge de sua sabedoria
(ele parece ser neutro nesta causa,
geminiano com ascendente em escorpião –
favorece ambos os lados)
Dizia que “ser um é cadeia”,
Citando num lindo poema que: “o poeta é um fingidor”.
Ele finge dor,
Se faz fingidor,
Mas reinterpreta toda a dor interna e recebida,
Para colocar em ordem o caos de universos e tantos.
No fundo o poeta nada mais é
Do que aquele que sente,
Para descrever o que sente e fazer-se sentir,
Costumo denominar como a santíssima trindade,
Pai – filho - espírito santo, amém.

- “Estamos perdendo o paciente..”....

Bem, já tinha escrito três cartas.
Na primeira, destinada a você,
Fazia um trocadilho bem sem graça com tijolos,
Pedindo que não abrisse as outras duas cartas,
Que não eram suas
Na segunda, destinada ao um/terço
(escrevi em Julho,
quando não sabia nada das coisas todas,
e novamente foi cuspido o passado)
Ressaltava que ele lhe amasse
Sem prender e todas as coisas mais
Que escrevi quando fui chamado de derrotado.
Na terceira, para a sua família,
Agradecia por de alguma forma,
Terem criado um ser humano delicado e inteligente,
Com senso de justiça.
Obviamente que não mandei nenhuma carta.
Aprendi a me editar.

“Corta-se e lança-se ao fogo”...

Quando lhe vi novamente,
E bebemos tererê com vodca na praça,
Entendi com mais clareza,
Que sempre houve falha de comunicação.
Você era você?
Vinicius eu sei que era uma barreira de Vinicius.
Parei para ver as suas partes
Onde não tinham frases prontas,
Músicas engatilhadas,
Palavras todas certas...
Desde Fevereiro quando disse
“temos que parar por aqui”
Deitado comigo do lado esquerdo da cama,
Você me desconstruiu por completo.
Quando mais tarde no mesmo dia,
Na rodoviária, me mostrou o que estava além das metáforas.
As minhas palavras não preencheriam nada naquele momento,
Deixei de ser palavra.
E você foi e não acabou vendo
O resultado da minha reconstrução “saudosístisca”,
Sem a necessidade das palavras e sua rítmica.

Voltei a ser leve como o menino que já fui,
Me importando bem pouco se a último pessoa com que deitei
Sabia foder direito,
Ou se as pessoas não queriam ou queriam beber,
Fumar, sair e gritar por aí
Tudo o que gostam ou não gostam,
Vomitando pelos dedos um mundo
Que não podem e nunca vão ter (criado na fantasia facebookiana)

- “Precisamos fazer uma manobra de reanimação!”

Eu nunca precisei viver na miséria cinzenta
De um lugar que não é o meu.
Parei de fingir dor,
Deixei de ser fingidor
E resignifiquei quem você já “conheceu” um dia.

- “Estamos o perdendo... Oxigênio! Rápido!”

E quando você virou ausência,
Eu respirei a vida.
Me deparei com a minha liberdade.
Passei a ter sobre as mãos
As escolhas que posso ser/fazer/aprender/plantar/colher...

- “Um, dois, três... Reanime!”

Você nunca foi um objeto,
Para ser buscado ou para suprir alguma necessidade.

- “Força garoto, não desista agora!”

Nas despedidas você vai descobrir
Que quem lhe ama sem propriedade,
Não irá lhe ver como um fardo,
Nem mesmo durante a ausência.
Não o tratará como um objeto,
Mas com o respeito que você exige e que merece.
Já reparou que as despedidas
São mais longas do que as chegadas?
Nas chegadas tudo é tão simples,
As horas de sono que não são perdidas,
Conversando até dormir.
Depois não fica mais tão simples,
Se despedir não é apenas mais você com você.
As horas viram insônias,
As perguntas incômodas,
As notificações não mais lidas ou respondidas,
Tudo perde a graça.
Dê alguns dias, semanas, alguns meses.

“Toda árvore que não dá bom fruto”

E quantas vezes parado em uma fila de saúde
Você não se perguntará: por que sou eu?
Quantas vezes mais esperará que o universo
Lhe traga o bom e correto
Por todas as atitudes boas e sensatas que faz cotidianamente?
É preciso ter coragem caro leitor,
Coragem acima da média, para sair do ninho.
Sempre na espera?
O que você tanto procura nos outros
Que tem medo de achar em você?
Por que o mundo implica tanto
Com alguém quer ser por direito, aquilo tudo que é?
É pedir muito a liberdade para se ir e voltar
Sem o peso diário das responsabilidades
E consequências de todos os atos da semana,
Do mês, dos anos passados?
Quantas vezes você terá que mandar um meme de gatinho,
Postar um texto político,
Bater no seu peito e dizer que existe?
Isso é de hoje?

“Toda árvore que não dá bom fruto”

Quando irá se aquietar dentro de um peito
Que não seja uma gaiola de pássaros sem graça,
Cotidiana e rotineira?
Quantos cigarros você ainda vai acender
Enrolando com as folhas da bíblia?
Quantas vezes mais você embarcará em um ônibus,
Colocará “Banks, Lorde, The Neighbourhood...” nos ouvidos?
Para quantos ainda sentará em um gramado
E irá dizer: preciso lhe contar uma coisa?
O número exato para todas estas respostas não existe.
Não existe porque uma possível resposta também não.
E se a dor for grande, a solidão cinzenta e sem cor,
A vida pesada, apenas tenha orgulho.
Orgulhe-se não apenas porque eu
E um punhado de pessoas acreditou em você e seus propósitos,
Mas porque o ser humano que é,
Que já foi sincero e machucado,
Que levou um mundo pesado sozinho nas costas por tanto tempo,
É mais do que apenas um sobrevivente,
É alguém que vence a si mesmo todos os dias,
Buscando verdades e intervalos de sanidades
E insanidades também verdadeiros.
“Passe-me o bisturi, monitore o batimento”

Não cutuca a Alice. Não cutuca o POETA.

“Corta-se e lança-se ao fogo”

Quantos dias mais eu ficarei por aqui?
O número certo não existe.
Já reparou como tudo acaba,
Mas como tudo nunca é exatamente do mesmo jeito?
Se despedir não é apenas eu e mais eu,
É você e mais você também.
O “ainda não” eu também decido.

Parta para longe, mas não parta um coração,
Parta enquanto ainda dá tempo.
Se não ficar, saia. E se ficar não minta.
Toca o tambor e reflita.
Toca o tambor e deixa partir...

“Saia do mar
linda sereia
Saia do mar
venha brincar na areia
Saia do mar
sereia bela
Saia do mar
venha brincar com ela”

Toda árvore morre só.
Toda árvore é solidão.
- “Perdemos. Ele está morto”
Causa da morte: sem explicação.
Toda árvore que não dá bom fruto
Corta-se e lança-se ao fogo,
Passe-me o bisturi,
O último verso, eh-eh-gogo!
Deveria ter mandado cortar?

By: Vinicius Osterer

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